19.8.08

Crie seu próprio arquivo: Mandinga, manha & malícia

Torpedeira Piauí
Coraçada na Bahia
Marinheiro absoluto
Chegou pintando arrelia
Quando vê cobra assanhada
Não mete o pé na rodia
Que a cobra assanhada morde
Se eu fosse a cobra eu mordia
Mataram Pedro Mineiro
Dentro da Secretaria

O livro Mandinga, Manha & Malícia, uma história sobre os capoeiras na capital da Bahia (1910-1925) escrito por Adriana Alberta Dias, também conhecida como Pimentinha nas rodas de Salvador, é um ótimo livro, muito bem escrito e muito informativo.

Pimentinha analisa as vidas dos capoeiras em Salvador durante este período. Ela, utilizando documentos oficias, artigos da imprensa, e entrevistas com velhos capoeiristas, mostra como os capoeiristas usavam a mandinga e a malícia não só nas rodas de capoeira mas também no seu dia-dia para sobreviver e, e as vezes ainda mais importante, para ganhar fama nas ruas. Ela reflete como isso influenciava a prática da capoeira, dos movimentos às músicas e cantigas. A ladainha em cima abre o capítulo sobre o famoso Pedro Mineiro. Aqui, um trecho do capítulo:

… Não era natural do estado da Bahia, havia nascido em torno do ano de 1887 na cidade de Ouro Preto, estado de Minas Gerais, por isso ficou conhecida pela alcunha de Pedro Mineiro. Aos seus vinte e poucos anos já se encontrava em Salvador, sabia ler, escrever, foi morador da freguesia do Pilar, e trabalhou como carregador e marítimo. Era muito conhecido pelos agents da ordem em virtude do seu comportamento valentão e das façanhas praticadas nas ruas de Salvador. Seu nome aparecia com freqüencia na coluna policial da imprensa baiana, sendo chamado de gatuno, capadócio, criminoso, facínora e célebre desordeiro. O principal palco de suas desordens era o Cais Dourado, mas também frequentava o “27 do Tabuão” e o “botequim do Galinho”. Costumava arrumar desavenças com todo tipo de gente, outros capoeira, mulheres, desordeiros, indivíduos comuns, marinheiros e, principalmente, policiais.
Uma das aventuras de Pedro Mineiro inspirou esta ladainha. No que foi chamado "o crime do Saldanha", porque aconteceu na Rua do Saldanha, Pedro Mineiro e alguns amigos capoeiras desafiaram um grupo de marinheiros:
No dia 26 de dezembro um outro conflito a bala explodiu entre capoeiras e um grupo de marinheiros do torpedeiro Piauhy, chegado do Rio de Janeiro há três meses. O palco da desordem foi o “botequim do Galinho”, onde os marinheiros jantavam, quando foram atacdos pelos capoeiras Pedro Mineiro e Sebastião de Souza, e por um individuo chamado Antônio José Freire, também conhecido por Branco.

O tireteio durou cerca de quinze minutos, provocando grande alvoroço e muita correria. Todos os botequins, lojas, armazéns e residências da região fecharam portas e janelas. Na luta, dois mariinheiros foram mortos…

Os demais marinheiros, feridos, conseguiram escaper e voltar ao navio. Pedro Mineiro, Sebastião e Branco tentaram fugir pelas ruas da Sé, mas foram presos por guardas civis e pessoas do povo, conduzidos aoposto policial mais próximo, e de lá transferidos para a Secretaria de Segurança Pública.
Como Pimentinha explica, ninguem sabe direito a causa da briga entre os marinheiros do Piauhy e os capoeira, se fosse por causa de uma mulher, ou se um sargento tivesse mandado os capoeiras atacar os marinheiros para vingar uma refrega que tinha acontecido alguns dias antes. De qualquer forma, dois dias depois da briga, houve um inquérito na Secretaria. Enquanto os capoeiristas respondiam as perguntas:
… um dos marinheiros do Piauhy, sentindo-se insultado, atirou contra Pedro Mineiro dentro da chefatura de polícia, diante das próprias autoridades. Assim, de acusado, Pedro Mineiro passou também a ser vítima, pois ficou gravemente ferido, atingido no ombro, na perna, e ma região lombar.

Esse ataque provocou, evidamente, uma enorme confusão, com mais de vinte praças de poliícia, marinheiros, oficiais de justiçia e o delegado atropelando-se na correria, fato que permitiu a fuga de Branco e Sebastião… [Sebastião foi] perseguido por um marinheiro até a Rua de Faísca, onde recebeu uma facada tão profundo nas suas costas que chegou a ter os seus rina atingidos.
Parece que Branco consegiu fugir. Os marinheiros foram castigado pelo capitão do Piauhy e os capoeiras foram levados ao hospital, onde ficaram sob a guarda da polícia.

O crime e a condição de Pedro Mineiro foram “manchetes de primeira pagina” na imprensa baiana. Enquanto isso, o capitão do Piauhy e o chefe de polícia trocaram correspondência se acusando de incompetência. Depois de uma tentativa de suicidar-se, que também saiu nos jornais, Pedro Mineiro morreu no dia 15 de Janeiro:
… Pedro José Viera veio a falecer no Hospital Santa Isabel, em virtude da impossibilidade de extração da bala de um dos tiros recebidos … Tinha 27 anos de idade, e foi enterrado no cemitério da Quinta dos Lázaros.
Como já falei, o livro é muito bom, tem muitas histórias interessantes e muitos fatos importantes. Vale a pena adicionar a sua biblioteca.

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